domingo, 29 de janeiro de 2017

GARRAFADA PARA DESAJUSTES HORMONAIS


Penso sobre princípios de aerodinâmica e combustão. Penso também em pequenas magias e coisas transcendentais: como garrafadas para curar males e mazelas. Uma garrafada de Aloe Vera e formol, por exemplo. Será que adianta? Resolve meus problemas?” Conto para uma amiga e gargalhamos juntas. Ela me diz para esquecer as garrafadas. Diz que para quase todas as coisas, precisa-se apenas de dois dias. Não tem quaisquaisquais;não tem mimimi;
seja para iniciar um regime, cair na esbórnia, aceitar ou não uma proposta, mudar a vida em tudo ou em nada! Uma cesta de métodos mais dois dias de concentração e tudo se resolve. Ela diz que desse jeito, não vai ter aloe vera que faça páreo! Quanto ao formol, nem pensar, não é? Me pergunta se quero, por acaso, estacionar nesse estado de coisas ou qualquer outro? E já sai dizendo que o movimento rejuvenesce!  Gosto da minha amiga!
Ela olha para os fios soltos que afinal, sempre vão existir e me oferece palavras rede onde experimento um existir borboleta... um existir pétala, que dança com o vento. Seja como for, se o tempo não pode ser revertido, a mudança cabe no oco da mão e mora ali, bem debaixo do hálito quente. Uma harmonia delicada entre a força que impulsiona as asas e um viver que é tão fugaz. Um estado de fenômeno que eu inspiro e sigo.  

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

MATÉRIA SEM CULPA



Capto a vida através de instrumentos. Mergulho em diferentes águas e pinço toda sorte de objetos: flutuantes, evanescentes, com mais ou menos contraste entre eles e a água. O critério é o visgo dentro do olhar. Só o visgo. Ainda assim são objetos fugidios. Através deles, palmilho e desvendo. Depois percorro a orla com os pés descalços. Orla e órbita. Tropeçando em pequenos crustáceos, eu desvelo. Sangro no perímetro das coisas que tem textura, aroma e intensidades. Desenho nós dois sentados na areia. Sentados na beira em volta do buraco. Em volta da beira e da probabilidade. Da possibilidade. Às vezes é como gravidade: Não dá para negociar. Fóssil sem corpo; mas, afinal, quem dorme com cães, não necessariamente vai acordar com pulgas. Além disso, diante da tv, vejo tudo que pode haver de submerso em Moçambique, e que apenas três moças, antes dos 30 anos, podem desvendar e desvelar em rede para o mundo. Sem sair do sofá vou explorando a densidade da água, escuto jubartes cantando e procurando o calor em águas africanas, fico sob o pôr de sol alaranjado capturado por alguém. Faço parte da cena. Do ocaso. Se não é verdade, a ideia serve de cola para que eu possa parar de pé. No mais, às vezes, tudo que se precisa é uma mudança de lugar. Uma palavra que salte também dá jeito. Palavra vôo, por exemplo, palavra verbo conjugada no imperativo do desejo para descansar do conforto de outras: palavra rede, palavra almofada, palavra colchão. Eu voo. Qualquer coisa no baixo abdômen faz pressão. O desejo exerce pressão: até a palavra exerce. Uma palavra estranha - um x com som de z - que se tem que engolir como regra. Pressão também diz respeito à minas. Detonam. Tudo vai pelos ares. Roupas dentro do armário, pedaços de papel e tampas de bueiro. Pressão expulsa. Manda para o espaço o que estava encalacrado. No mais, não se tocam as efemeridades. Não se seguram os vendavais. E, felicidade não precisa de culpa. Ao fim e ao cabo, diz Tom Zé: mando a consciência junto com os lençóis para a lavanderia. 

BURACO DA FECHADURA

ilustração: Estevão Teuber



pela fresta, pelo vão
olho-me nas pontas dos pés:

em meu cheiro
metade;

quem é essa moça nua,
essa outra que me espia
pelo buraco da fechadura?


poema do livro BRICOLAGES para GELADEIRA, 2006.

sábado, 21 de janeiro de 2017

EU SOU O MEIO ##

ilustração: Cy Claudel
um ponto de vista obtuso: salto e me derramo sobre o vão. sou argamassa. cal e cimento, os ferros amarrados e depois, tijolo sobre tijolo. sou o vento que bate no rosto, o sol sobre a cabeça, a pinga no final do dia e quem sabe isso tudo mais meus erros de cálculo, meus destroços e a tentativa de formar um cômodo. um cômodo apenas onde eu possa me abrigar, inclusive de mim mesma, e criar tubulações pra ver a água jorrando da torneira e enxaguar o rosto ou tomar um copo dela ou mesmo meter a cabeça embaixo dela. trago em mim trincas e fissuras estruturais; mas há pilares, vigas e um enorme baldrame para a inconstância e  as movimentações a que estou sujeita, embora os efeitos de um sorriso desatem em vértebra depois um solavanco ou beijo de supetão, e deve ser por isso que sob determinados ventos eu desabo inteira no meio da sala de estar. sim. ainda assim sou tijolo sobre tijolo dos sonhos da casa inteira e suas partes, da torneira e da água jorrando sobre minha nuca e meus olhos enxergando o ralo da pia e meus ouvidos escutando a água cair sobre um tanto de silêncio e vontade.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

POEMETO PROSEADO PARA PAIXONITES AGUDAS E CURÁVEIS


POEMETO PROSEADO PARA PAIXONITES AGUDAS E CURÁVEIS


foi quando olhou de lado e fez uma ruguinha no canto do olho. cócegas do universo bem debaixo da perspectiva-possibilidade do arco-íris. atrás tinha um cinza tempestade tentando varrer o tempo. aí depois falou qualquer coisa que não lembro. mas tinha um roçar de pêlo e pele pelo antebraço na frente. era o quê mesmo? desculpa. aí depois tinha um riso no canto da boca e aquela música mambembe atiçando o horizonte e a lua. é, tinha a lua. tinha tanta cor lá em cima (até o cinza que de quando em quando se abria em raio de luz e silêncio). depois tinha a noite que viria depois dos raios de luz. o roçar dos pneus no asfalto e outro sorriso no canto da boca, debaixo da ruga do olho olhando ainda assim, de lado, tudo de bom que há nessa vida ♯♯♯

domingo, 15 de janeiro de 2017

MAIS UMA DE AMOR

 



Entre tantas coisas, uma coisa.  
Plutônio + potássio + açúcar comum = bomba, injetar gasolina ou querosene em uma lâmpada e quando você acende = buuum!!! (sim, a onomatopeia é minha). Há também onomatopeias providenciais, talvez um dia especial e talvez um neurologista que não entenda nada de amor. Mas ele pode dizer que, ainda que seja improvável, o recomendável é manter-se isento. 

Se o constrangimento piora a gagueira, eu não sei absolutamente nada sobre incêndios e explosões e preciso ganhar tempo. Então ele me diz que nossa mente tende a encontrar padrões... Tende? Talvez por isso eu passe lustra-móveis em todas as portas antes do meu amor chegar. Pergunto ao neurologista quanto tempo precisarei para viver entre tantas coisas sem apenas uma? como manter o escrúpulo diante do que me aborda pela porta da frente? Ele sorri e diz que para abrir ou fechar a porta basta girar a maçaneta. Que todo o mais pode ser arbitrário ou adjacente.

MINHA MENINA



Resultado de imagem para meninas desenho tumblrResultado de imagem para meninas desenho tumblrResultado de imagem para meninas desenho tumblrela tem cabelos longos e um encontro de vogais dentro do nome. no sorriso deixa entrever uma covinha. moro ali quando ela sorri de olhos arregalados. é quando aparece a sabedoria e a força do verbo.  um prenúncio de algo no passado que não foi completamente terminado. um atravessar pelo tempo. uma fábula para eu me aninhar. o mundo inteiro cabe nela. cabe até o universo. desolha meu oi bem lá dentro do olho e sorri fingindo sentir a alegria que sente. depois continua, ainda que sem falar. sem fazer sorrir a covinha. é onde lá? a gente sai pela porta da frente?  ela se ri do que inventa. tem um jeito só seu de arrumar o cabelo e de desenhar o caminho por onde passa e desarranja as definições todas. até as que insistem em resistir. depois ela parece guardada nas palavras, sobretudo nas mais simples e curtinhas, feito o seu nome. ainda que tenha sido feita sem a prerrogativa do nome, ela é toda cada letra e circunstância dele. tem também um hiato  no nome dela; que é um pedaço de tempo que define agora e depois. isso é, ao menos, duas vidas em uma. sorri quando digo para ela essa insignificância, mas tem um punhado de despropósitos na bolsinha que carrega atravessada no tronco. e faz arquiteturas e brejeirices como ninguém. tece de rios e flores um pedaço de papel. a parede, o banquinho e a penteadeira do quarto. no meio da sala, debaixo da noite, e da penumbra da noite, lê recostada no balanço da cadeira. sonha mundos. põe sol e chuva sobre o sofá e a cristaleira. sobre o tapete heróis espalhados com as pernas sobre a mesa. garota prodígio, tece de invenções os meus despropósitos e desperdícios. de novo eu moro na covinha enquanto ela, ali, vai enchendo vazios e adentrando o que pode haver no que se apresenta. uma manhã de sol, uma saia feita de cobertor, uma boneca assustadora que vai para o fundo da prateleira. (des)inventa as coisas enquanto fala e eu vou escutando as cores do que diz. acho mesmo que fico lá na música de fundo que sua voz vira e me entretém. ela me carrega assim para a cena que inventa e me deixa inaugurar horizontes que não conhecia. e isso é quando eu pego delírio e entro em estado de contemplação. pois dentro dela há profundidade e silêncio; e há tantas vidas dentro. cabe o universo nas covinhas que o sorriso dela faz. ela poderia ser tantas e é. ela é todas quantas houver e é também cada uma e a mistura delas. ela é porque é e é também quando eu a recrio ou invento. mas eu, eu olho mais um pouco a covinha e sei que mesmo, mesmo; ela é a minha Iaiá.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

MADALENA

Madalena

Ilustração: TULIPA RUIZ
Olhos rasos, levanta toda manhã. Prediz as circunstâncias do dia que se elabora. Sol dentro. Põe os pés sobre o tapete. Sente as fibras do junco. Pensa na Bahia. Faz uma prece ao santo e bípede, ergue-se. Sabe que pode caminhar sobre duas pernas e isso lhe basta. Lava o rosto e se demora em frente ao espelho. Alisa a pele com o creme. Isso a restitui do ontem, do silêncio que faz ainda eco em seus ouvidos. Deixa escorregar o vestido sobre o corpo que desperta e veste a sandália. Miss, atravessa a sala em direção à cozinha. Para em frente ao espelho que há no meio do caminho. Confere. Prepara o café na cafeteira expressa e aguarda que comece a subir até que a fumaça, até que o cheiro da fumaça verte pelos azulejos e toma a sala (até o quarto vazio) e a casa vizinha com a janela aberta. Derrama o líquido escuro sobre a porcelana da xícara, sobre o açúcar e a expectativa que lhe ronda. Sorve de gole em gole o café enquanto amealha suas coisas e põe na bolsa. Pega as chaves. “Logo estarei de volta”. Olha a sala mais uma vez, mais uma vez se olha no espelho. Sai e deixa a porta bater atrás de si. Uma força impele seu ato, aciona neurônios e sinapses, inunda seu corpo de hormônios. Gira nos calcanhares, faz uma curva e retoma os passos (as setas dentro). Madalena é, absolutamente, fruto da evolução. Fruto do indizível que perpetua suas lógicas. 
Mais tarde, ao destrancar a porta, respira um pouco mais o café que ainda perfuma a sala e se olha de novo no espelho. “Estou de volta”. Atrás da cortina, e atrás das nuvens por trás das cortinas, o sol ainda não brilha. Mas vai brilhar. Pega o elástico sobre a mesa e prende os cabelos:


segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

O FOTÓGRAFO





Eu fotografo ideias e projetos para ver as estórias. Para capturar e interpretar o momento. É então que a imagem é bandeira que defendo; argumento que apresento. Se a vida é um evento, eu fotografo para conservar. Para guardar.  Feito poema onde guardo o que é primeiro plano e também o plano de fundo. Desarticulo para ver mais a gravidade da cena. E de novo interpreto. No fundo, sou contador de estórias e fotografo para guardar. Ontem, por exemplo, a vazante de águas raras e claras eram como janelas no manguezal; e eu interpretei a dinâmica da seca e da cheia naquele poema. Eu mata ciliar; distância e invasão, contato, conflito e argumento, eu espécie entre as espécies que fotografo.


quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

PARA O ANO NOVO de Patricia Claudine Hoffmann

Para o ano novo... por Patrícia Claudine Hoffmann

Os fins não justificam
os medos.
Então
que ao menos os anjos
cuidem das marés.
E o mar tenha a generosidade
de não agredir
a fuga.
Porque há uns barcos pequenos
no lado de dentro.
- que ninguém faça mais
nascer a fuga -
Que o ano novo traga
estoques de ajuda.
Estanque as correntezas
do ódio,
transborde odes
de paz e amizade.
Que a fé não seja o único lugar
seguro,
mas traga algo além
do alento
no escuro.
Restaure os terrenos, as luzes,
os risos, os rios, as casas,
os camicases arrependidos...
Que a nova fase
encontre oásis humanos.
E que este não seja só
mais um poema só
de fim de ano.

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SOBRE QUESTÕES RESPIRATÓRIAS E AMORES INVENTADOS

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