sexta-feira, 23 de setembro de 2011


PALAVRAS E VENTOS 

Caros leitores, depois de quase três anos escrevendo aqui neste espaço, chega aquela hora denominada despedida. A flutuação das coisas trouxe minha vida para o Rio de Janeiro e, embora esteja enlaçada com Joinville, é preciso seguir o fluxo. Ver os presentes que flutuam em todos os movimentos. E como não estar feliz quando o presente extrai o que nos passa pela alma? Foi isso que, sobretudo, recebi com o presente de estar aqui: a oportunidade de, a cada quinta-feira, extrair o que assoberbava ou assolava. Fosse a chuva sobre o transparente do meu guarda-chuva ou a folha que redemoinhava na calçada. Presente sem preço. E por falar em presentes e coisas que redemoinham ao vento, penso em uma miniatura de fusca para colocar na estante, um livro com palavras que já li, uma comida preparada com especiarias leves ou um sabor inusitado no meio da maionese. Um sorriso largo em uma foto ou os cabelos voando com o vento. Uma paçoca, um pé-de-moleque ou aquele doce de flocos de arroz. Quantas coisas pode haver para se dar para alguém? Um torpedo enigmático pelo celular, um texto qualquer no jornal da cidade, uma letra de música. Dizer palavras ensaboadas, com cheiro de côco, e depois dizer as mesmas palavras enxaguadas em amaciante de roupas. Quantas voltas se deve dar para atingir alguém em cheio? Para estar na praia em um ponto qualquer onde somente ele saiba e ficar lá esperando só para deixar claro que não há nada que se possa fazer? Quantas vezes os olhos podem escorrer como manteiga por detrás dos óculos escuros sem que ninguém saiba? De quantas tentativas se pode lançar mão para alcançar o céu com as unhas e tentar riscar ou perfurar para encontrar o azul? Eu talvez pudesse pensar em mais coisas, mas o fato de ser meio de setembro anuncia a chegada próxima da primavera e contorna momentos de despedida. É com esses pensamentos que me servi de palavras com o intuito de transpassar rios e mares, descer e subir por estradas e ladeiras, redemoinhar em bueiros e entrar por soleiras de portas. Em quase 150 textos, toda semana eu enviei palavras que entraram sorrateiras e desordenadas por vãos de porta, que repousaram sobre mesas nos cafés da cidade e me conectaram com pessoas que me receberam sempre com muito carinho. E como alguém já disse, fiz isso com prazer lexotânico. E por falar em palavras jogadas ao vento, outro dia, depois de devorar uma paçoca, fui até a lixeira na esquina da rua para jogar o papel. Não é que bateu uma lufada de vento que desviou meu gesto e fez o papel alçar vôo sem que eu pudesse alcançar? Pois é. Palavras e papéis de paçoca estão no vento junto com partículas de tudo que pode haver nos encontros, nas chegadas e nas partidas, na boa surpresa que o contato pode propiciar. E foi isso que eu tive aqui. Obrigada e um grande abraço a todos. Continuaremos a nos ver nas curvas dos ventos.

terça-feira, 20 de setembro de 2011


O GRITO

O 7 de setembro de 1822 já passou. 189 anos atrás. Mas a simbologia atravessa os anos. Cantar o hino. Hastear bandeiras, desfile de tropas e de estudantes. Lembrar e pensar o quanto esta data, mais do que comemorativa de um fato, exprime o desejo de uma nação. O ato de Dom Pedro é repleto de controvérsias históricas que não cabe aqui falar. Quero dizer é da importância do simbólico na comemoração do dia. E não é à toa que faço isso uma semana depois da data. A despeito de como tenha sido decretada a independência, penso no que isso representa pra nós hoje. No que significa viver em uma nação independente e que tenha força e competência para trilhar esse caminho. Bem sabemos que a independência é um ideal. Não é real porque não existe independência por si só e sim a que se estabelece no contato, nas inter-relações, no jogo de direitos e deveres e tantas outras coisas. No ceder e avançar das diferentes frentes, dos diferentes lados. E isso pode acontecer de forma equilibrada ou não. Enfim, a declaração de D. Pedro envolvia o interesse de muita gente. Pactos com uns e rupturas com outros. E se foi ele que apareceu quando se abriram as cortinas, as coxias e os bastidores fervilhavam. Como se sabe, se o grito do Ipiranga não libertou efetivamente o Brasil, cada bandeira hasteada no dia 7 de setembro aponta para a simbologia do desejo de cada brasileiro e que vai se reconfigurando na passagem no tempo. Vão se ajustando as velas. E isso não ocorre sem embates. Isso se faz com a consciência de que sempre haverá interesses em jogo, e com o conhecimento de que é preciso que o povo detenha consciência política para engajar-se em um desenvolvimento sustentável, organizado e equilibrado. Para que possam ser promovidas mudanças que culminem em uma nação humana, soberana e agindo em inter-relação com outras nações.  D. Pedro I, montado em seu cavalo, desembainha, ergue a espada e proclama: “Independência ou morte”. Um ideal em contraposição ao real. Seja como for, 189 anos depois a simbologia resiste. Por isso a razão dessas datas existirem e serem comemoradas. Porque a simbologia permite que se atravesse o real. Com todas as suas circunstâncias e inconstâncias. Com toda a problemática que pode haver nos enfrentamentos. É só daí que esse sonho de independência pode tomar corpo como algo mais próximo do real. A independência de uma nação está atrelada à independência do indivíduo, coisa só possível mediante o livre acesso à educação e ao conhecimento, entendendo-se aí a concretude de coisas básicas como saúde, alimentação e transporte. É a partir da existência de cidadãos-pessoa que o verdadeiro grito de independência de uma nação é dado.  

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A MINHA, A SUA, A NOSSA ESTÉTICA

A MINHA, A SUA, A NOSSA ESTÉTICA   

De frente para o espelho, penso no formato que as coisas têm. No que tentamos moldar. Minhas unhas, por exemplo: elas tinham um formato antes que alicates se metessem nas cutículas alterando o seu desenho. Talvez por permear esse estranho período eu pense agora que somos máquinas. Máquinas de usar e ser usadas. Por outros e por nós mesmos. E por mais que vozes queiram se instaurar contra isso (até aquelas que vêm de mim mesma), não há mal nenhum nisso. Somos máquinas comandadas por um cérebro, por um inconsciente e por um coração que não mora bem no meio do nosso peito. Se o tempo é a acumulação contínua dos segundos, eu projeto meus sonhos para construir. Para costurar e representar "idéias" que possam traduzir algo qualquer que está mais além e que nem sempre eu posso ver. Algo que, entre outras coisas, tem também uma estética. Se, como dizem, "não importa ser; há também que parecer", é interessante também pensar que nosso ser também se pauta por 
intencionalidade e criação: seguimos por aí subindo e derrapando em ladeiras. Andamos a pé e de avião. De carro e carrinhos rolemã. Saltamos com ou sem para-quedas e nos estatelamos ou não no final de cada percurso. Com mais ou menos escoriações. Somos máquina e matéria com digitais específicas e por vezes mais de um registro de identificação. Com contas aqui, no exterior ou mesmo sem absolutamente nenhum dinheiro no banco. Nenhum tostão dentro dos bolsos. Nus sem mãos no bolso. Não importa. Entre a possibilidade de uma vontade que é potência, por baixo ou por cima de qualquer escombro, somos portadores de sentido e é aí que vem a estética. A modelagem. O quanto o mergulho nesse ato pode nos afundar ou fazer emergir é coisa que não se sabe. Mas sei bem que em algum momento devemos introduzir uma separação, um corte qualquer para canalizar o desejo e dizer: agora eu vou. Com mais ou menos luz. Nessa ou naquela linha. Seja como for, até o formato de minhas unhas indicam uma coisa qualquer que é relativa ao meu desejo e que me estrutura em meio a um vazio e alguma névoa. O vazio que me estrutura, seja eu um monumento em pedra e cal ou um painel misto de opacos e transparências;  mais ou menos nua, mais ou menos sólida. O fato é que sou criatura de desejos. Que interpreta e é interpretada diante do insondável nas relações. Diante dos desafios. Os meus e os de qualquer pessoa. A estética? Bem, é algo que se liga ao novo e que se produz no laço. No contato. Se for criativo, melhor.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011


VAZIOS, SUPER E ANTI-HEROIS

Dia desses me vi a pensar em super-herois e em mundos de fantasia, onde a principal protagonista, parodiando a língua do espetáculo, é a espetacular, a majestosa, a surpreendente... Imaginação. Aquele lugar onde o inconsciente tem voz e palco. Que espaço mais absoluto os super-herois, esses seres sobre-humanos poderiam ocupar? Se há quem possa estar na base das cenas da ilusão e de toda uma sorte de desejos, esses são eles. E o bacana com relação aos super-herois é que suas aventuras expressam fantasias comuns a algumas pessoas ou grupos, e isso carrega o conceito de uma questão que também é do campo da energia. O desejo de poder, por exemplo, é uma das expressões de desejo inconsciente que ganha asas no mundo da fantasia, onde, quase sempre, não há farol vermelho. É lá estão os super-herois rompendo os limites e atuando na busca de valores como justiça e defesa dos necessitados. E é lá então que se vêem coisas como voar, virar pedra, água, fogo, elástico, rede e tantas outras manifestações. Tornar-se invisível, por exemplo. Seja como for, mesmo o mais destemido dos super-heróis possui pontos fracos. Quem não conhece a temível criptonita para o super-homem? Ou, o que seria da Mulher-Maravilha sem seus braceletes? Como se isso não bastasse ela ainda tinha um avião invisível! Enfim, a imaginação é que é um presente. Eu cresci, a Mulher-Maravilha não é mais minha heroína e eu mesma é que tenho que dar conta de descobrir meus super-poderes reais e imaginários para lidar com o dia-a-dia. Isso me coloca no ponto que eu pretendia chegar: Falar de um super-herói que conheci em 2006 e que desde então, sou, absolutamente, fã. Ele é o intrépido, o corajoso, o poderoso, o super, o ultra Super Empty!!! Quem não conhece, segue a sugestão para buscar conhecê-lo. Mora em um livro publicado pela Editora Planeta, de autoria de Luciana Pessanha e José Carlos Lollo.  Um livro branco com um furo na capa. Uma ótima ideia que representa muito bem o super-heroi que traz um buraco, um furo, um vazio, bem no meio do peito. Buraco que depois de incontáveis desventuras, ganhou um E lá dentro para representar o heroi. Ou o anti-herói. Não faz mal. Ele conhece o poder das palavras que nem sempre funcionam, ele fracassa, ele deprime, reconstitui-se e o principal, descobre que através do seu vazio pode enxergar possibilidades de ver mais além. A partir daí atua sobre as perguntas e perguntas sem fim que as pessoas se fazem. Como dizem os autores, não se chama o Super-Empty em casos urgentes como incêndios, crimes, barragens se rompendo ou vilões ameaçando a humanidade; dado que para isso existem os bombeiros, o exército, a polícia e até outros heróis. Super-Empty atua em funções praticamente insolúveis, mas ele senta ao seu lado e mostra como é olhar além. Olhar através dos vazios que temos e enxergar possibilidades. E o melhor: faz isso em 127 páginas deliciosamente ilustradas e repletas de bom humor. Ele é, sem dúvida, uma deliciosa caricatura do desejo de Luciana e José Carlos que descortinam uma heroica maneira de pensar em heroicas soluções para certos estados de caos que desabam vez por outra sobre nossas cabeças. É bem aí que o Super-Empty pode aparecer.


Postagem em destaque

SOBRE QUESTÕES RESPIRATÓRIAS E AMORES INVENTADOS

http://metropolitanafm.uol.com.br/novidades/entretenimento/imagens-incriveis-mostram-a-realidade-das-bailarinas-que-voce-nunca-viu...