terça-feira, 26 de janeiro de 2010

SOBRE ANIVERSÁRIOS E PRESENTES

Crônica publicada no caderno ANEXO do jornal A NOTÍCIA de Joinville em 21 de janeiro de 2010.

Na terça-feira, fiz 44 anos. O inusitado da condição desse ano me fez pensar sobre presentes. Não do tipo objetos, mas presentes “virtuais”. Pois são mesmo coisas “não palpáveis”. Falo de coisas que conectam mundos, pessoas, pensamentos, numa espécie de vida paralela. São coisas que nos chegam e nem podemos medir o quanto são “reais”, são canais e fluxos diversos e a interpretação do que podem representar é nossa. Não que eu normalmente não pense nessas coisas. Penso muito. E sou feliz com isso. Mas tirar o dia para ver assim é um pouco diferente. Meu marido viajando, minha família morando em São Paulo, e foi surgindo uma possibilidade em torno da ideia de, dessa vez, não fazer alvoroço com a coisa. Experimentar a sensação de estar só e estando só, ser. Estar na praia fez isso ser ainda melhor. Acordei e coloquei um CD que não escutava há muito tempo. Ouvir a voz da Fernanda Takai foi algo que desejei quando comprei. Ouvi então sua linda voz. Amo vozes femininas. Amo canções, amo cantar. E vi nisso um presente. Falando em música, na sequência ouvi um CD que uma amiga me deu semana retrasada, “KAIA N’GAN DAYA” do Gil. Dancei, curti. Presente. As duas coisas. Enquanto escrevia a crônica, o celular vez por outra tocava ou sinalizava mensagem: presente bom que indica pessoas lá longe conectadas com a gente. De súbito lembrei de uma amiga dos tempos do colégio que aniversaria exatamente no mesmo dia que eu. Ano passado ela me ligou após anos sem a gente se ver e se falar. Esse ano eu liguei. Ela ficou tão feliz! Foi presente pra mim a felicidade dela. Só pra não dizer que nenhum “presente efetivo” se apresentou, meu marido ligou logo cedo e perguntou se eu já tinha ido ver o cachorrinho que eu tanto que queria e que uma amiga avisou que tinha vindo uma ninhada. Ele, que não quer cachorrinho, sinalizou um desejo de partilhar comigo o meu desejo. Disse: vai lá, dá uma olhada neles, se gostar de algum você pega. Nem sei se vai dar certo, mas o desejo dele de partilhar isso comigo foi um presente. Outro presente foi estar presente no aniversário de minha afilhadinha, Beatriz, na semana passada. Que delícia de momento ver a alegria dela cantando parabéns e enamorada da mãe, olhando-a com doçura, entendimento. E ver a mãe, minha amiga querida, emocionada até a raiz dos cabelos com isso. Um presente esse amor. Um presente poder estar lá, partilhar isso, ver e sentir isso. Outra coisa que pensei, em meio à paz e dois dias de sol seguidos em São Chico, foi o quanto desejei durante a correria do ano passado, estar na praia, cuidar da minhas plantinhas, dormir na rede, ler os livros que separei pra ler, organizar as idéias, o material da faculdade. Descansar e me preparar para outro ano de informações, correrias, trabalhos... E finalmente, depois do alvoroço “fim de ano” tive essa oportunidade. Presente sem precedentes. E falando em presente sem precedentes, sem preço, sem tamanho, lembro da oportunidade que tenho toda semana, de partilhar com tanta gente um pouco sobre minha ideia das coisas aqui nesse espaço do jornal. Com esse de hoje, são 50 textos onde tive a rara oportunidade de experimentar, toda semana, a angústia e o encantamento de escrever. De fazer isso com compromisso, com dedicação, com amor e felicidade. Que presente é receber mensagens dos leitores e vê-los partilhando comigo algumas coisas que permeiam a vida da gente. Ter o leitor sempre na minha cabeça. Porque não há escritor sem leitor, não há cumplicidade sem compromisso, jogo sem troca. Esse contato é coisa sem preço. É presente. E eu agradeço enamorada. Bem, vou zarpando continuar essa “aventura presente” que é viver. Gil tá lá rodando no CD: “Dont worry about a thing, cause every little thing is gonna be alright”.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

ALGUMAS COISAS QUE SEI

Crônica publicada no jornal A Notícia de Joinville. caderno ANEXO, p.03 em 14 de janeiro de 2010.


1. Uma pessoa que arremessa latas de refrigerante ou cerveja pela janela do carro não tem a menor consciência de educação e cuidado com o meio ambiente. Deixe isso claro quando acontecer perto de você.

2. Uma pessoa que é toda charmosa com você, mas grosseira com alguém que lhe presta um serviço, não tem como ser uma boa pessoa. Diga isso para ela.

3. Incomodam-se menos com a gente do que a gente pensa. Não tenha medo de ser feliz!

4. Pessoas que falam muito de si e não abrem espaço para ouvir o outro, não estão a fim de compartilhar nada. Livre-se delas.

5. Definitivamente certas vezes é melhor calar-se. Saiba enxergar esses momentos.

6. Certas vezes é fundamental botar a boca no trombone. Instrua-se sobre a população argentina e seus famosos “panelaços”. Somos muito mansos aqui no Brasil. Muito mansos.

7. É bom aventurar-se romanticamente em algumas atividades que desenvolvemos, mas o fazer com afinco, rigor técnico e disciplina é que pode nos lançar nas verdadeiras aventuras.

8. Embora possam amar você de qualquer jeito, busque ampliar-se. Sempre.

9. Quando alguém roubar seu coração, vá lá e tome-o de volta. Seu coração é seu. Dê em troca umas balinhas. Chiclete também pode ser.

10. Falando em balinhas, quando quiserem dar seu troco em balinhas, recuse. Sai mais barato comprar quando tiver vontade; além do que, de centavo em centavo o pessoal do comércio faz verdadeiras fortunas e você fica com as balas.

11. Se puder e tiver chance, ame uma pessoa “errada”. 100% de chance de ela “iluminar” sua evolução absolutamente necessária.

12. Olhe com atenção para a maneira como descarta resíduos em sua casa. Acondicionando corretamente, um saquinho plástico abriga muito mais. Use com moderação e critério.

13. Mande embora os pensamentos individuais. Pense no todo, no contexto. Vai ver que o individual ganha outra dimensão.

14. Ninguém é obrigado a gostar de política, mas ela afeta nossa vida. 2010 é ano de eleição. Busque informar-se por diversos canais.

15. “Um inseto espatifado no parabrisa da minha vida” – uma fala do Garfield quando seu dono traz um cachorro pra casa e ele se vê obrigado a dividir seu espaço - é algo pra se ouvir e dar uma boa risada.

16. Assuma que certas vezes sua vida é caranguejo: anda pra trás. Dê esses passos tranquilamente aceitando a ideia de que algumas vezes é preciso recuar para depois avançar. Não é clichê. É vida.

17. O corpo guarda nosso dentro e nossa casa guarda nosso corpo. Entender essa dinâmica nos abriga das tempestades diversas. Nos livra de corromper nossos invólucros. Pense na sobrevivência. Pense nos caramujos.

18. Arrume um tempo na sua vida para escutar “Paciência” de Lenine. A vida é realmente rara.

19. E por falar em música, é bom fechar os olhos e dançar ao ritmo das badaladas. Faça isso. Deixe seu corpo falar.

20. Amando a poesia como amo – sobretudo o efeito dela – recomendo: poeme-se.

21. E falando em poesia, leia em voz alta e bem pausadamente este trecho de um poema da Viviane Mosé:

“...e por falar em sexo quem anda me comendo

é o tempo

na verdade faz tempo mas eu escondia

porque ele me pegava à força e por trás

um dia resolvi encará-lo de frente e disse: tempo

se você tem que me comer

que seja com o meu consentimento

e me olhando nos olhos

acho que ganhei o tempo

de lá pra cá ele tem sido bom comigo

dizem que ando até remoçando.”

sábado, 16 de janeiro de 2010

SOBRE GAVETAS

Olá leitor! Mais um ano termina e outro começa. Esse ano eu caí com a crônica de Natal e do reveillon. Sendo uma pessoas fácil-fácil de enxergar o sub-texto das coisas que me acontecem (inclusive é verdade que muitas vezes enxergo o que não existe), logo pensei: isso quer me dizer alguma coisa... Dias assim nos chegam como possibilidade de organização que se apresenta e que a gente então aproveita para olhar melhor papéis e coisas que fomos amontoando. Organizar a vida e as gavetas. E aí me lembrei de uma crônica muito bacana do Antonio Prata, chamada GAVETA, onde ele fala dos pensamentos que surgem em meio à sua arrumação (precisa ganhar mais dinheiro, terminar seu romance, ler Proust, procurar um analista, arrumar uma secretária...), e que termina de modo surpreendente. Lembro um poema que fiz com o mesmo nome e, como ele, penso que somos sim o conteúdo de nossas gavetas. Elas nos definem e declaram de nós. Minha mente viaja rapidamente para a ideia do funcionamento cerebral organizado como arquivo de pastas suspensas, e daí (romântica que sou), começo a pensar não em arquivos e pastas, mas em gavetas. E tudo começa a tomar um sentido poético. Nós mesmos como lindas cômodas. Daquelas antigas, rococós, cheias de gavetas, gavetinhas e gavetões. Com pátina ou verniz, mas de madeira de lei, de tutano. Talvez pela carga de final de ano, talvez por romantismo, salto das expectativas futuras para desejos tão guardados que até cheguei a esquecer no decorrer dos anos. Vejo chamazinhas crepitarem e caio no presente. Porque o passado será o que eu fizer hoje e o futuro também. E as gavetas todas estão em mim. Uma porção delas. Umas eu abro todos os dias, outras eu tranco e jogo a chave fora, ou perco. Tem aquelas que eu queria caber dentro. Trancar por dentro e engolir a chave. Tem gavetas que guardam segredos e outras que são lindamente escancaradas ou desvendadas. Algumas são abertas sem que eu perceba, e então sou obrigada a olhar o que está lá dentro. Outras até nos esquecemos delas. Um dia abrimos e lá está a surpresa. Podemos jogar fora, ou quem sabe, descobrir um uso novo para aquele conteúdo. Certas gavetas ficam sempre tão aparentemente fechadinhas. Só os amigos especiais sabem que elas estão abertas. E então mostram pra nós o lá dentro. Tem também as que a vida abre. A gente até tranca e engole a chave. Mas a vida coloca explosivos... E elas começam a abrir e a gente começa a ver. Tão bom isso. Poder esquecer, lembrar, trancar, arrombar a fechadura, ver. Poder arrumar isso de vez em quando, ou toda semana, todo ano. Ou manter em ordem para evitar complicações. Ou virar tudo de cabeça para baixo – em cima da mesa da sala. Então, em meio à minha bagunça de 2009, repito a fala de Antonio Prata: “2010 que venha”! Gaveta não há de faltar! Além do que, caso resolva aguardar mais um tempo sem mexer nisso - eu adoro baús e cômodas cheias de gavetas – jogo tudo lá dentro. Quando possível eu abro. Deixo aqui o meu poema. (Ano que vem nos vemos.)  Que todos tenhamos um lindo início de ano. Nós e o conteúdo de nossas gavetas.


Gaveta

vasculho a gaveta do apartamento da rua boa vista

o fio retorcido envolve a lâmpada

quem sabe aquela que iluminou um dia escuro aqui na praia

depois que fizemos amor à luz de velas

um resto de fio para varal – aquele que te pedi

lembro das roupas que ainda esperam por ele

pregos, parafusos, tomadas,

se confundem com o pó de madeira

chaves, cadeados

um resto de veda rosca

não pode conter esse fluxo

duas luvas esquerdas, restos de fita isolante colados em

pedaços de papel

sacos plásticos, extensões

tento soltar, desfazer nós

mal posso distinguir nossa vida amalgamada.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

MADALENA

Madalena
Ela levanta todas as manhãs com os olhos rasos – prediz as circunstâncias do dia que se elabora (ainda é incerto se o sol brilhará pela manhã ou só despontará pelo meio da tarde) e põe os pés sobre o tapete. Sente as fibras do junco. Lembra da Bahia. Faz uma prece ao seu santo e ergue-se, bípede que é. Não suspeita das dificuldades de um parto por conta disso! Sermos bípedes e termos cabeça grande. Tudo bem. A seleção natural explica. Ela sabe apenas que pode caminhar sobre duas pernas – isso lhe basta. Lava o rosto e se demora no espelho. Alisa a pele com o creme. Isso a restitui do ontem, do silêncio que agora já não faz eco em seus ouvidos. Deixa escorregar o vestido sobre o corpo que desperta e veste a sandália. Miss, atravessa a sala em direção à cozinha. Para uma vez mais no espelho que há no meio do caminho. Confere. “Está tudo bem”. “Volto logo”. Prepara o café na cafeteira expressa – aguarda que comece a subir – o barulho, a fumaça, o cheiro que verte pelos azulejos e toma a sala (até o quarto vazio) e a casa vizinha com a janela aberta. Verte-o então na porcelana da xícara, sobre o açúcar e a expectativa. Sorve de gole em gole enquanto amealha suas coisas e põe na bolsa. Pega as chaves. “Logo estarei de volta”. Olha a sala mais uma vez, mais uma vez se olha no espelho. Sai e deixa a porta bater atrás de si. Tranca. Ela tranca a casa só. Sua casa. “Volto já”, ela pensa. Já na rua, enquanto caminha bípede, pensa: “Eu não me rastejo”. “Eu não ando sobre quatro patas”. Nem decifra que assim, talvez, as coisas ao menos parecessem mais fluidas. Até seu nascimento. (Viria pronta para tocar o chão, quadrúpede e com o crânio relativamente menor). Não se suspeita produto da evolução, de seleção natural. Dentro ou fora do pool genético para o melhor desenvolvimento das futuras gerações. Apenas caminha e expele dos pulmões o ar e respira um outro tanto dele. Apenas sente o peso da bolsa atravessada no tronco, (Uma espécie de abraço – alguém disse para ela) e diminui a distância entre ela e aonde vai. Entre o que vai fazer e ainda não fez. Mas deu quase todos os passos necessários até agora. Mais alguns e estará defronte ao momento. Para. “Não vou”. “Eu não vou”, repete para si. E não vai. Segue a suspeita. A intuição a guia de modo quase inquestionável. Algumas vezes duvida. Hoje não. Uma cadeia toda de moléculas acionando a resposta. Forças espessas impelindo o ato, acionando hormônios, acionando neurônios e sinapses. Gira nos calcanhares e retoma os passos (as setas dentro). Madalena é, absolutamente, fruto da evolução. Fruto do indizível que perpetua suas lógicas. Ao destrancar a porta, respira um pouco mais o café que ainda está lá, se olha de novo no espelho. “Pronto. estou aqui”. Atrás da cortina, e atrás das nuvens por trás das cortinas, o sol não brilha. “Talvez desponte no meio da tarde”. Pega o elástico sobre a mesa e prende os cabelos.

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SOBRE QUESTÕES RESPIRATÓRIAS E AMORES INVENTADOS

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